~#APRECIADORES DO ABISMO#~

terça-feira, 4 de janeiro de 2011

~☥Desassossego☥~


úlia estava deitada sobre o catre da cela branca. Ela estava presa a uma camisa de força e seus olhos buscavam o vazio das recordações: da velha casa onde vivera com o pai e uma madrasta que ela não gostava.

Muitas vezes costumava sair para o Bosque das Flores durante a noite. Chegava à trilha que levava ao riacho. Sentada na praia Júlia sempre esperava os pirilampos com suas luzes verdes acendendo e apagando repetidas vezes como se dessem sinais de alerta. Era nesse momento que sua mãe, morta há cinco anos, aparecia em forma de fada voando entre a luminosidade dos insetos.

“Seu pai está feliz. Eu estou feliz, Júlia”, dizia enquanto ziguezagueava em volta da filha. Júlia ouvia e esboçava um sorriso. Se sua mãe estava feliz porque seu pai estava feliz no novo casamento por que ela também não deveria estar? Na maioria das vezes, quando voltava para casa, encontrava o pai na sala de jantar, sentado à mesa com a madrasta.

Júlia dizia: “Papai...Mamãe está feliz porque você está feliz”. O episódio repetia-se a mais de dois anos e tornou-se um transtorno para o homem, que não achou outra solução a não ser internar a filha de 15 anos no Asilo Nossa Senhora das Dores. Quando os enfermeiros chegaram vestidos de branco Júlia ficou apavorada. A injeção foi a solução encontrada para acalmar a jovem. Desde aquele dia nunca mais que Júlia deixou de tomar injeções e ingerir comprimidos de todas as cores.

Desde que fora internada continuou a ver a mãe todos os dias e durante o dia inteiro: “Se seu pai está feliz eu estou feliz”. Cássia aparecia para Júlia, sua filha adorada, repetindo a mesma frase.


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